ZÉ GRACIA E OS PERNILONGOS GIGANTES

DA SERRA DA PAULA

Ele dizia que andou muito. Frequentava a Serra da Paula, nos contrafortes da Serra da Mantiqueira, na confluência dos municípios da Lagoa Mansa. Do Baependy, de Itamonte e das Juruoca. Eram tempos de estradas difíceis e mata cerrada. Dias e dias andando sem que se visse gente. Selva mesmo onde só apareciam bichos que hoje ninguém jamais ouviu falar. Esses bichos sumiram, amedrontados com a ocupação desse animal humano que dá tiro pra todo lado, fala alto e faz queimadas grandiosas. Na época, não tinham também tantos forasteiros das grandes cidades como agora. Ocupando tudo. Comprando as imagens, o por do sol, as campinas. compram até mesmo as histórias que se perdem numa oralidade que chamam de virtual. Sem mistério e sem crença. Esse bicho, chamado humano, vai se reproduzindo e aumentando qual praga desordenada.

Zé Garcia certa vez foi picado por um pernilongo gigante, de mais ou menos um palmo de comprimento. Segundo descrição do próprio Zé, talentoso contador de estórias, era igual a um pernilongo comum. Mesma tessitura, mas era um bicho que ele nunca tinha visto. Repita-se que detalhado relato era do próprio Zé Garcia, sem testemunhas. 

Certa vez ele viu um enxame voando em sua direção. Saiu como doido pelo campo até chegar em outra mata cerrada. Pela riqueza de tantos detalhes não tinha como não acreditar em Zé Garcia. Seus relatos eram precisos e esmiuçados como um tecido que se compõem geometricamente.

Sobre os pernilongos gigantes ele dizia que zoavam como essas muriçocas que nós ainda conhecemos hoje, mas tinha um ferrão mais poderoso e que matava.

Zé Garcia sabia das histórias da Lagoa Mansa com precisão e requinte.

Esse mundo tão prenhe dos humanos, por todo parte, ressente-se de contadores como Zé Garcia que, ao que consta, não deixou discípulos.